[EU ESTAVA LÁ ANTES DOS FILTROS QUE HOJE ESCONDEM O QUE QUASE NINGUÉM SABE SOBRE VOCÊ]

Fellipe Tavares
3 min readJan 9

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café, andando pra lá e pra cá, cidade velha, tudo envelheceu aqui, tudo volta pro mesmo lugar. quero encontrar o tom ideal pra te ofender, sabe? quero dizer coisas horríveis sobre você e logo em seguida desatar a fumaça do último trago. boxeadores pendurados num cabo de aço, dentro de mim, dançam a coreografia arruaçante que vai te expurgar da próxima página.

ainda há em mim esse ruído cru e amargo que escapa do silêncio de um passado que não me interessa mais. não há espaço aqui pra você, mas como sempre fui talentoso com exceções, vou revirar o esqueleto da tua presença e tolerar mais uma vez o teu cinismo e apatia. estou entediado, pois você continua o mesmo clichê, o mesmo animal ensaiado e patético que sempre foi, e continua sendo. preguiça.

BORED! MUITO BORED!

não há verossimilhança para a nossa plateia, a única coisa que há são vários complexos e ódios acumulados, chega desse papo de que passou. afinal, quantos anos já passaram? eu sei lá porque me coloquei nesse lugar em nome de um bem estar que nunca existiu. em nome de um grupo de pessoas que nunca fizeram perguntas críveis sobre o que aconteceu entre nós. você nunca se importou com ninguém, só com você e o colapso das estórias que você cria sobre você mesmo. e eu me fodi quando decidi que me importar era algo importante, continuo achando que é. fazer o que, eu adoro me foder.

bom, pensei em construir ofensas poéticas e novelísticas sobre você, mas se tem algo bom sobre seu personagem é a capacidade de fazer merda e criar camadas espontâneas e chocantes, juro.

você já

já fingiu reencarnações, já forjou doenças, já fez promessas incapazes, já tocou uma serenata fazendo o público acreditar que era sobre amor, mas era sobre um pedido de perdão. já fez cara de choro depois que derrubou um corpo sem pedir licença, já usou a astrologia pra fugir da terapia e enganar o telespectador. PISCIANO É O CARALHO. o que te falta tem nome, o que te falta é consistência, esse barulho de buzina me atormenta, eu comprei teus inimigos enquanto acreditei na tua tese. o roteirista já cansou desse teu surrealismo execrável e o dadaísmo questionável, você é patético e continua sendo.

eu nunca fui a mocinha noventista desengonçada dessa estória e esse é o meu grande triunfo, o meu maior plot foi uma simples sentença: a escolha. eu escolhi viver enquanto seu espetáculo era um ensaio nos bastidores do teatro, joguei o jogo, me machuquei porque a guerra que foi estabelecida não era parte dos meus planos, mas essa dor foi coisa pouca perto do amor que experimentei. e eu experimentei bastante.

fim do ato, créditos finais.

você continua cativando a pequena plateia que sobrou com a sua insolência e displicência, problema deles. é o preço que eu pago por falar demais. enfim, esses são os meus créditos finais. todas as informações vão subindo na tela enquanto eu estou só (só) vestindo uma camisa surrada encostado na varanda, não há cigarros, mas há vontade de fumar. você não merece que eu acenda um cigarro. algumas cenas fragmentadas vão sobrepondo a cena principal, a xícara da minha mão cai e se espalha, o novo frame é a queda da xícara. o público sente saudade de mim, volta um frame meu chorando (pega bem mocinhas chorarem) pelo fim do fim do fim do fim do fim do fim do fim, na rua você vai embora com aqueles que expulsei daqui, também estou chorando pela ausência dos que foram. cinema mudo. a xícara acaba de cair, minhas lágrimas se esgotam, começa a chover, simbolismo pra limpeza espiritual e toda essa palhaçada que eu adoro. saiu da varanda, frame de uma vassoura e um pé com chinelo varrendo a varanda, a grande porta fecha, a chuva vai cessando e o sol do fim de tarde aparece. frame dentro do apartamento, arco-íris ao fundo e eu danço. só danço.

os créditos finais acabam.

fim.

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