[ESSE TEXTO NÃO É SOBRE NÓS DOIS]

Fellipe Tavares
3 min readJul 25, 2020

Do tempo que você chegou para a última semana existe uma longa distância, não só de tempo, mas de desconhecimento. E reconhecimento. E novos desconhecimentos. E antigos reconhecimentos.

Eu te perdi tantas vezes no meio de tantas vidas, vergonhas, inseguranças e irremediáveis circunstâncias. Eu te perdi não só na estação da Sé. Eu te perdi quando decidi que te perder seria o melhor para nós. Eu te perdi quando meu maior temor era te perder para outro alguém, mas eu já tinha te perdido antes de qualquer outro alguém aparecer. Minhas impensáveis obsessões levantaram os bloqueios que provocaram esse ruído entre o que digo e o que você ouve. Entre o que você diz e o que eu ouço.

Do tempo que você chegou para a última semana existe uma longa lista de segredos desvendados. De cervejas tomadas. De estranhos encontros e de confortáveis conversas. São anos tentando encontrar um equilíbrio que segure o que fomos, com o que somos e com o que queremos ser. Eu não quero ser aquele que abre as cortinas e te acorda pela manhã seguido de um íntimo e corriqueiro beijo. Eu não quero ser aquele que te ajuda a completar sua coleção de discos, porque isso te faz feliz. Eu quero ser aquele que permanece. Aquele que atou um nó leve entre nós, um nó que une os sentimentos bons que nutrimos e afasta tudo aquilo que não deu certo, porque já não importa mais. Não somos mais uma questão.

Mas na última semana surgiu uma questão. Que não era nossa. Era sua com ele. Com aquele eu quis ser, bem longe do que ele foi e perto do que ele poderia ter sido.

Te ouvir falar provocou em mim a mais profunda inquietação. Eu quis tanto poder te proteger desses sentimentos que consomem suas delicadas verdades. Eu quis tanto tornar aquela difícil confissão algo tolo que nos fizesse rir. Te ouvi falar dele não me machucou. O que me machucou é ele ter te machucado.

E eu gosto de ser esse que sou agora. Esse que queria que ele tivesse sido melhor, para que nessa última semana a gente tivesse discutindo o sofá, seu novo sofá. Da sua casa, da sua nova vida partilhada com alguém que ama.

Mas existem dores que partem nossos corações e que no passado não achávamos possível acontecer. É bom lembrar dos dias em que a gente acreditava. Só acreditava. Nos sonhos mais puros que tínhamos. Nas aventuras mais despojadas e honestas que vivemos. Na rodoviária. Na praia. No cinema e no beijo daquela árvore. Eu queria ser de novo aquela pessoa, não pelo o que fomos, mas pelo o que a gente acreditava que podíamos ser. No singularidade e na pluralidade de nós.

Eu queria que pudéssemos trazer de volta aquela fé. Para que fosse menos complexo acreditar no que a gente ainda precisa acreditar. Para que as nossas dúvidas se diluíssem no meio de novas ideias. Para que você pudesse entender o que foi aquele seu amor que ainda não deixou de ser. E que te amedronta quando algumas coisas são consideradas. Eu queria que encontrar com ele fosse fácil para você como é fácil para mim te escrever esse texto.

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