[E NESSE VAMO VÊ NINGUÉM VIU MAIS NADA]

Fellipe Tavares
3 min readJan 22

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você me pediu pra não sumir, sem saber que eu não sei como sumir, são as pessoas que somem de mim. você disse que nunca tinha pensado em ter alguém, sem saber que eu já tinha pensado em ter você. você disse que estava feliz por ser eu seu o escolhido, sem saber que eu já tinha me elegido seu. tô aqui, sentado em almofadas vendidas por ambulantes urbanos, uma cueca barata e uma camiseta amarela de ficar em casa, esquecida (mas lembrada hoje) na gaveta. te tirei do fundo, senti o cheiro cru do mofo e senti saudade da doideira que senti quando você estava aqui. maluquice total era nós dois. essa camiseta amarela que visto agora é meio você, esquecida, mas cabe bem. e depois de hoje, nunca mais pretendo usá-la.

vou escrever sobre você e fim.

fiim do texto.

somos uma estória arcaica e repetida de opostos que se trombam pra cumprir a função de apenas existirem na oposição e ensinar um ao outro como isso pode dar errado, todos sabemos que dar errado é uma questão de perspectiva, mas a minha literatura não gosta de percepções positivas. eu gosto de dizer que tudo deu errado [e deu tudo errado]. você chegou atrasado e eu chorei naquela cama estranha, pois foram quilômetros que percorri ouvindo um álbum melancólico e rascunhando o momento em que te diria que quero ficar. eu queria ficar. dissolvi nesse ficar, dissolvi brutalmente na argola da tua orelha, encostado em você e sentindo seu peito dançar, meus pés erguidos pra completar seu corpo e alcançar teu pescoço.

é que depois de muito tempo,

mas muito tempo mesmo,

te achei.

a praia das Astúrias não era mais meu endereço, eu era de Ipanema. percebi que não tenho um mar pra chamar de meu endereço, sempre me deito na areia de alguém, nada é meu, é tudo deles. seu, eu era seu. — eu quero ficar mais. eu disse. você riu. — aí é foda. você disse. a saliva do nosso beijo ainda pulsava em mim, mas seus pés estavam rígidos no chão. eu tentava me equilibrar, mas sempre que minhas asas abrem, me perco nas possibilidades. você continuava rígido. eu preciso aprender a voar. — vem. se você tivesse dito — vem, eu teria ido, na exata hora que você dissesse — vem, — anda, — vem. você jamais diria — vem, você é mais do tipo que diz vamo vê. vamo vê. bora ver. vamo marcar. não, eu sei que não diz isso na tentativa de enrolar meu corpo num — talvez, sei que diz pra tomar cuidado, sei que diz em nome do seu pessimismo organizado. é que você quer ver mesmo, — bora ver, quer calcular a rota entre o glitter da minha saliva e o carvão da tua escarrada. você não pisa em falso, no campo minado você é daqueles que fica ali analisando e eu saio correndo, se explodir, explodiu. EXPLODIU. você ficou analisando as explosões e eu sai correndo jurando que você estava me seguindo.

eu corri……………………………………..corri muito………………………………..

sério, eu corri pra caralho.

olhei pra trás. ofegante. o meu fôlego era seu. eu era seu. nossa, mas que cansaço. ué, cadê? perdi de vista. e a vida seguiu. nunca mais o vi. e nesse vamo vê, ninguém viu nada. você sabia, mas não queria me dizer. eu também sabia, mas também não quis me dizer. amo me enganar. todo mundo me enganava, inclusive eu. eu era seu. venci essa maratona descontrolada, adivinha o motivo. eu te digo — vamo vê. é que eu vivi. eu vivi um amor. eu amei, amei demais. sério, amei pra caralho. vivi um amor justamente por ter me enganado. quem não viveu ficou pra trás analisando passos, recolhendo explosões, remoendo um pessimismo ensaiado que não serve pra nada, só paralisa. eu prefiro os que correm. foda-se se o que eu vivi é somente meu, ninguém é capaz de tirar isso de mim. vivi. você ficou. escrevo sobre você e te devolvo pra gaveta torta da casa da minha Mãe, amanhã eu acordo cedo e a rotina vai te apagar de novo.

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